O clima era de “balada”, como adiantou Bono em engraçado português às 90 mil pessoas que compareceram ao Morumbi na noite deste sábado (9) para o primeiro dos três shows do U2 no Brasil. Mas, no final, a alegria deu lugar à tristeza: na última canção, “Moment of surrender”, o líder da banda de Dublin fez um discurso em homenagem às 12 crianças vítimas do massacre na Escola Municipal Tasso de Silveira, em Realengo, no Rio.
“Liguem seus isqueiros, seus celulares, vamos homenagear essas crianças e suas famílias”, pediu o cantor, enquanto o nome da uma dúzia de vítimas aparecia no telão 360º. Um momento triste e bonito, que marcou a segunda parte (melancólica) do bis. O oposto da energia que o grupo levou ao palco a partir das 21h40.
Em exatas duas horas de apresentação, o grupo justificou porque a atual turnê é a mais lucrativa da história: com uma estrutura de palco jamais vista, o U2 cumpre o que é, de fato, “o maior espetáculo da Terra”.
A “garra” de quatro dedos que serve para sustentar as caixas de som e de luz é tão grande (50m) que pode ser vista fora do estádio. Já o telão que se contrai e expande proporciona uma experiência e conforto de ser ver um show em arena jamais visto.
“É muito bacana você poder ver um show independente de onde estiver ou de seu tamanho”, afirmou a assistente administrativa Renata Luna,de 30 anos. Cadeirante, ela pode ver a apresentação em uma área reservada, ao lado do amigo Thiago Motta, 26, também cadeirante. “É sensacional, só digo isso”, resumiu ele, olhando para o alto.
Trem das 21h40
Logo após o show do Muse, que terminou às 20h40, o Morumbi já estava lotado. Casais, muitos grupos de amigos e de excursões faziam pose em frente à “garra” assim que desciam da rampa em direção ao estádio. Quem era de fora da cidade não fazia questão de esconder a procedência, caso das uruguaias Natalia Pumar (35 anos), Gabriela Vartanian (34) e Cecília Camacho (40).
Logo após o show do Muse, que terminou às 20h40, o Morumbi já estava lotado. Casais, muitos grupos de amigos e de excursões faziam pose em frente à “garra” assim que desciam da rampa em direção ao estádio. Quem era de fora da cidade não fazia questão de esconder a procedência, caso das uruguaias Natalia Pumar (35 anos), Gabriela Vartanian (34) e Cecília Camacho (40).
“Crescemos com o U2, as músicas deles acompanharam nossas alegrias e tristezas. Principalmente nos namoros”, brincou Gabriela, enquanto exibia uma camiseta da seleção celeste. Ela, assim como o estádio, passou os 60 minutos de intervalo da apresentação sem tirar os olhos do telão, que exibia um relógio que fazia uma falsa contagem regressiva para o começo do espetáculo.
Às 21h30 o mesmo relógio começou a se desintegrar e o sistema de som da “garra” colocou “Trem das onze” (Adoniran Barbosa) para tocar. Minutos depois ecoou “Space oddity” (David Bowie), que serviu para o telão ligar de vez e trazer a ilustração de uma nave especial. Pelas janelas dele se espia o grupo chegando ao palco, um ritual voyeur que acontece desde a turnê Zoo TV (1992-1993).
Assim como nas três apresentações argentinas, o U2 abriu com “Even better than the real thing”. A escolha não foi das melhores, visto que boa parte do público pulava mais pela empolgação de ver a banda ao vivo do que por gostar da música. Esses dois fatores se juntaram, porém, quando The Edge disparou o riff de “I will follow”.O som, até então abafado, só melhorou a partir de “Magnificent”.
Até aqui a “garra” se mostra tímida. É preciso “Get on your boots” para ela se revelar. As pontes que ligam o palco à passarela circular se mexem e o guitarrista e o baixista caminham pelo público, uma forma de agradar quem está nas laterais e até mesmo atrás deles.
Aqui vale um parêntese: a “garra” e o telão foram teoricamente desenhados para que qualquer pessoa, de qualquer ponto do estádio, tenha uma visão privilegiada. Isso não é lá muito verdade... Quem pagou para ficar no setor amarelo, atrás do palco, poderá de fato ver o show, mas praticamente só pelo telão 360º e com os músicos de costas.
São raros os momentos em que Bono e companhia vão para trás da bateria e mostram suas faces para os expectadores desses locais. O baterista (Larry Mullen Jr.), aliás, só dá esse gostinho quando toca tambor no remix de “I’ll go crazy if I don’t go crazy tonight”.
Geralmente nos shows do Morumbi esse setor é fechado por estar atrás de onde ficam tradicionalmente os palcos. Mas no caso do U2 ele foi aberto graças ao design da “garra”, que ainda serve para colocar 20% a mais de pagantes na arena (Paul McCartney encheu o Morumbi com 64 mil pessoas no ano passado, para efeito de comparação).
Dia de pizza, Pixinguinha e vaias à Dilma
Se o palco deixa uma falsa impressão, o mesmo não se pode dizer do telão de 500 mil pixels. Faltam adjetivos para defini-lo. Se até “Magnificent” ele serviu apenas para exibir os integrantes do U2, ora em cores ora em preto e branco, em “Mysterious ways” ele mesclou o conteúdo ao vivo com imagens psicodélicas de uma dançarina.
Se o palco deixa uma falsa impressão, o mesmo não se pode dizer do telão de 500 mil pixels. Faltam adjetivos para defini-lo. Se até “Magnificent” ele serviu apenas para exibir os integrantes do U2, ora em cores ora em preto e branco, em “Mysterious ways” ele mesclou o conteúdo ao vivo com imagens psicodélicas de uma dançarina.
Depois, antes de “I still havent’ found what I’m look for”, ele mostrou a tradução simultânea de algo que Bono inventou de improviso. “Hoje é dia de balada, de comer pizza e passear”, brincou o vocalista, ovacionado. “Sou pepperoni”, riu, comentando depois quais seriam os sabores de cada músico se eles fossem o prato. “Adam é mais exótico, seria pizza de banana. Edge está sempre atrás do obscuro, então seria uma pizza de jaca. Larry não teria nada de queijo nem tomate. Nós o chamaríamos de pizza boa pinta”, continuou.
Outras referências ao Brasil aconteceriam durante a noite. Antes de “Beautiful day”, Bono puxou uma garota da “red zone” e, juntos, leram um trecho de “Carinhoso” (Pixinguinha). O público veio abaixo.
Reação oposta aconteceu quando o vocalista citou seu encontro com a presidente Dilma Rousseff: as vaias engoliram os aplausos.
De volta ao telão, é após a balada politizada “Miss Sarajevo” que ele mostra o porquê de ser tão revolucionário. Terminada a canção, ele cresce de tamanho e “engole” a banda, agora dentro dele. Começa então “City of blinding lights”, cujos acordes inspiram uma sequência de cores hipnótica. Na parte do refrão, a antena gigante que fica sobre o meio do palco acende e holofotes são mirados para um único ponto do céu. Impossível não se arrepiar.
“Vertigo”, em seguida, transforma o telão em um imenso carrossel de imagens disparadas em looping. Um efeito visual tão impressionante quanto os globos de discoteca que iluminam o estádio durante “With or without you” - que traz Bono vestido com uma jaqueta de LEDs vermelhos, mesma cor do microfone suspenso que o faz rodopiar acima do público.
Passado, só o recente
Por se tratar de um show do U2, o telão também serviu para mostrar mensagens politizadas, é claro. Elas fizeram referência aos conflitos atuais da Líbia e Egito (para introduzir “Sunday bloody sunday”) e à política birmanesa Aung San Suu Kyi.
Por se tratar de um show do U2, o telão também serviu para mostrar mensagens politizadas, é claro. Elas fizeram referência aos conflitos atuais da Líbia e Egito (para introduzir “Sunday bloody sunday”) e à política birmanesa Aung San Suu Kyi.
Já o arcebispo Desmond Tutu, sul-africano que venceu o Nobel da Paz pela luta contra o apartheid, apareceu fazendo um discurso motivacional para introduzir “One”. O público se dispersou neste momento e pareceu se importar mais em beijar seus conjugues assim que viu no telão o nome da balada de “Achtung baby” (1991).
O repertório do primeiro show em São Paulo, de 23 canções, priorizou os trabalhos do U2 da década de 1990 até a primeira metade dos anos 2000. Ficaram de fora canções de 30, 25 anos atrás, como “New years day”, “Pride (in the name of love)”e “Bad”, executadas nos dois últimos concertos portenhos da semana passada - o último show teve 25 músicas tocadas, por sinal.
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